Autores: Leonardo Medeiros Júnior e Ronald Medeiros de Morais
Fonte: Conjur
O Supremo Tribunal Federal finalizou mês passado o julgamento da ADPF 982/PR e, por unanimidade, atribuiu aos Tribunais de Contas a competência para julgar prefeitos que atuem como ordenadores de despesa. Essa decisão reforça a responsabilidade dos chefes do Executivo e permite a aplicação de sanções ou cobrança de débitos, sem interferir na esfera eleitoral. Proposta pela Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil (Atricon), a medida consolida o papel técnico das Cortes de Contas e fortalece a proteção ao erário.
Inicialmente, vale esclarecer que a arguição de descumprimento de preceito fundamental é um instrumento previsto na Constituição que permite ao STF analisar situações em que atos do poder público possam estar violando preceitos fundamentais, isto é, princípios e valores basilares da nossa Carta Magna. Em outras palavras, a ADPF age como um mecanismo “guarda-chuva”: quando outros tipos de ação (como a ação direta de inconstitucionalidade ou a ação declaratória de constitucionalidade) não se aplicam, recorre-se à arguiçã para proteger direitos e garantias essenciais a toda a sociedade.
No caso específico da ADPF 982/PR, que tramitou no STF, tendo como relator o ministro Flávio Dino, discutiu-se, em linhas gerais, se os Tribunais de Contas podem julgar prefeitos que atuem como ordenadores de despesa e aplicar-lhes sanções fora da esfera eleitoral (como imputação de débito ou multa), sem que haja a necessidade de confirmação posterior pelo Poder Legislativo.
A distinção é relevante porque a Constituição faz uma separação muito clara entre as contas de governo, julgadas politicamente pelas Câmaras Municipais (com base em parecer prévio dos Tribunais de Contas), e as contas de gestão, examinadas tecnicamente pelos próprios Tribunais de Contas.
O STF reafirmou que, quando o prefeito age como ordenador de despesa (assina contratos, autoriza pagamentos etc.), ele presta contas de seus atos de gestão diretamente ao Tribunal de Contas. Nesse caso, a Corte de Contas pode, sim, julgá-lo e aplicar sanções, sem passar por nova votação na Câmara Municipal.
Já as contas anuais de governo, que analisam o conjunto maior da execução orçamentária e das políticas públicas do município ao longo do exercício financeiro, continuam a ser julgadas pela Câmara Municipal, com base no parecer técnico emitido pelo Tribunal de Contas.
Decisão fortalece fiscalização do dinheiro público
O STF também reforçou que, no campo eleitoral, a competência para declarar o prefeito inelegível permanece com a Câmara de Vereadores, pois a Lei de Inelegibilidades (Lei Complementar nº 64/1990) define que a rejeição das contas de governo, para gerar inelegibilidade, exige decisão final do Legislativo. No entanto, a responsabilização administrativa e financeira (pagamento de débitos, multas etc.) é da alçada do Tribunal de Contas.
A decisão consolida a ideia de equilíbrio entre o julgamento político e o julgamento técnico. Protege-se a autonomia e a autoridade técnica das Cortes de Contas para coibir eventuais desvios na aplicação de recursos públicos e exigir reparação ao erário, enquanto se mantém o papel legítimo do Poder Legislativo para avaliar a dimensão política das contas anuais.
Assim, o julgamento do STF deixou três pontos claros: (1) prefeitos que ordenam despesas devem prestar contas diretamente aos Tribunais de Contas; (2) as cortes podem julgar e aplicar sanções em caso de irregularidades, inclusive exigindo a devolução de valores; (3) as Câmaras Municipais mantêm a análise dos efeitos eleitorais, mas não podem alterar as decisões técnicas dos Tribunais de Contas. Essa vitória fortalece a fiscalização do dinheiro público, trazendo mais transparência, segurança jurídica e confiança de que os recursos do cidadão serão protegidos de forma eficaz.
A decisão do STF valoriza ainda mais o trabalho de fiscalização exercido pelos Tribunais de Contas, que contam com equipes especializadas em auditoria, análise financeira e verificação de legalidade dos atos administrativos.
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