
Prisão por venda de Mounjaro em Bacabal.
Há mesmo crime?
Nos últimos dias, algumas prisões chamaram a atenção em Bacabal (MA): pessoas foram flagradas oferecendo para venda o medicamento Mounjaro (tirzepatida), usado no tratamento do diabetes tipo 2, mas também popularizado recentemente por seus efeitos na perda de peso.
A acusação?
Venda de substância proibida. O problema é que, juridicamente, essa imputação pode não se sustentar. Vamos aos fatos e ao direito.
O Mounjaro foi aprovado pela Anvisa em setembro de 2023. Trata-se, portanto, de um medicamento regularizado no Brasil, ainda que seu uso para emagrecimento seja considerado “off-label”, ou seja, fora das indicações de bula. Ainda assim, é prescrito por médicos e vendido com controle em farmácias autorizadas.
O tipo penal utilizado em muitos desses casos é o do art. 273, § 1º-B do Código Penal, que trata da falsificação, corrupção, adulteração ou alteração de produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais.
No entanto, esse dispositivo só se aplica quando há venda de medicamento falsificado, adulterado ou, em alguns casos, de substância expressamente proibida pela Anvisa.
E esse é o ponto crucial: a tirzepatida (princípio ativo do Mounjaro) não é proibida pela Anvisa. Ao contrário, está aprovada e regulamentada. Isso significa que a venda clandestina pode configurar outras infrações, como contrabando, exercício ilegal da profissão ou infrações sanitárias, mas não o crime do artigo 273 quando não há falsificação, adulteração ou proibição expressa.
Logo, a conduta pode ser considerada atípica penalmente sob essa tipificação, pois não se amolda à descrição legal do crime imputado. O Supremo Tribunal Federal, inclusive, já tem precedentes que afastam o uso excessivo e desproporcional do artigo 273 em casos de venda ou posse de medicamentos regularmente autorizados pela Anvisa.
Claro que a venda de remédio sem receita e fora das farmácias deve ser combatida com vigilância sanitária e educação em saúde pública. Mas é preciso cuidado para não criminalizar de forma equivocada condutas que não se encaixam nos tipos penais específicos.
Portanto, fica o alerta: é importante combater o comércio irregular de medicamentos, sim. Mas dentro da legalidade, respeitando os limites do Direito Penal e os princípios do devido processo legal.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Comente aqui. Sua opinião é importante e ajuda a formar a consciência coletiva.